Para além da morte de alguém, o luto é um encontro com o real. Um real que é, muitas vezes, angustiante, outras vezes melancólico, quando não se sabe o que foi perdido. Fiquemos no que é angustiante por um momento. A perda que se apresenta não é, sobretudo, inconsciente. É real e concreta. Como o objeto amado não mais existe, ele exige que toda libido seja retirada de suas conexões com esse objeto. O que parece quase impossível. A dificuldade é justamente em encontrar outro destino para o que estava direcionado ao objeto de amor que foi perdido.
Estranho Caminho, filme de 2024 dirigido por Guto Parente, me parece uma tentativa de elaborar uma perda, a perda do pai que partiu num contexto de distanciamento e dúvidas.
Tentativa que se associa com o prolongamento da imagem do objeto (o pai) e que produz uma satisfação, imediata ou não, mesmo que a realidade esteja insistente em afirmar a morte. O Eu, do sujeito, do personagem, precisa fazer a escolha de eleger outro objeto de amor: assumir outra posição libidinal. Isso implica não só a perda já concretizada no real, mas a conclusão de uma perda inconsciente – a chegada no ponto de não-retorno.
O trabalho de luto envolve também a recuperação do desejo. Mas para se chegar ao desejo, há o tempo da angústia. A experiência analítica pode ser pensada como uma passagem do luto, da inibição, ao desejo. É estranho o caminho até o ponto onde o desejo encontra sua condição.
| Estranho Caminho – https://embaubafilmes.com.br/distribuicao/estranho-caminho/.