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Ressentimento e "vingança"

Sâmila Candeia

Na clínica, frequentemente observa-se que as manifestações de ressentimento estão relacionadas a um prejuízo pelo qual o sujeito foi corresponsável, no mínimo por ter cedido a um outro, sem lutar, algo que dizia respeito a seu desejo.


O ressentimento seria nesse caso o avesso do arrependimento. O ressentido não se arrepende, ele acusa. A luta do ressentido é não para recuperar aquilo que cedeu (o desejo) e sim para que o outro reconheça o mal que lhe fez. O que se quer é uma espécie de vingança. Uma vingança imaginária e sempre adiada, fantasiada, distante da execução e próxima do prazer próprio da fantasia.


Entretanto, não devemos confundir o ressentimento com as expressões da mágoa. A mágoa é a dor de uma ferida narcísica que ainda não deixou de sangrar. Pode ser comparada ao luto pelo tempo de reparação de uma perda. O trabalho da mágoa, como o do luto, requer recolhimento (e acolhimento); a pessoa magoada sente dificuldade em fazer novos investimentos porque toda a energia, a libido, fica concentrada em cicatrizar a ferida aberta.


Há um outro sentido para a vingança, talvez mais interessante: tomar o verbo "vingar", não no sentido de "fazer mal" a um suposto agressor, mas no sentido de crescer, como uma planta que "vinga", que já não corre o risco de perecer. A maneira melhor não precisa consistir em produzir um sofrimento naquele que nos ofendeu, mas em conquistar a própria "vingança".



Do livro "Ressentimento" (2004) de Maria Rita Kehl.

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